sexta-feira, 7 de dezembro de 2012
quinta-feira, 24 de novembro de 2011
segunda-feira, 8 de agosto de 2011
UMA VISÃO SOBRE O CAPITAL
UMA VISÃO SOBRE "O CAPITAL"
Por Antonio Augusto Waltrick Loureiro
Karl Marx e de sua obra geradora da corrente de pensamento mais revolucionária do pensamento social e em virtude de suas consequências na prática social, requer uma ampla reflexão.
O pensamento de Marx, desdobrou-se em muitas correntes, baseadas nas diversas interpretações (nem sempre claras e corretas), feitas por pessoas muitas vezes incultas ou mal intencionadas, cujo objetivo quase sempre é desestabilizar o poder constituído, com o único intuito de assumir o poder, visando ao próprio locupletamento e utilizando-se do proletariado como massa de manobra para a ascensão pessoal.
Suas ideias ainda foram incorporadas e criticadas por inúmeros comentaristas, sociólogos e filósofos.
Ao escrever seus trabalhos de caráter sociológico, Marx tencionava não apenas contribuir para o desenvolvimento da ciência social, mas propor uma ampla transformação política, econômica e social.
O Capital, sua obra máxima, tinha como destino todos os homens, não apenas os estudiosos de economia, política e de sociologia. Em suas formulações havia sempre um alcance mais amplo, adquirindo dimensões de ideal revolucionário e ação política efetiva.
As contradições básicas da sociedade capitalista e as possibilidades de superação ditadas pela obra de Marx, não foram ignoradas pela Sociologia, posto que seria atitude ingênua e irresponsável, ignorar suas ideias, ainda que fosse conveniente. Entretanto aceitar suas ideias por completo, seria sem dúvida uma atitude cientificamente estéril e perigosa, por ser função primordial da ciência a análise e a comprovação técnica para uma aceitação em definitivo.
Marx em sua obra fez uma análise muito ampla, desenvolveu conceitos a respeito da alienação, classes sociais, valor, trabalho, mais valia e modo de produção.
Da Alienação
Dentro de sua obra, Karl Marx, analisa o capitalismo como meio alienante, que dissociou o trabalhador de seus meios de produção (ferramentas, matérias-primas, a terra e as máquinas), os quais passaram a ser propriedade do capitalista que era o tomador de trabalho. Diz ainda, que o trabalhador no sistema capitalista de produção, perdeu o controle do produto de seu trabalho, também propriedade do capitalista.
Declara que politicamente o homem também se tornou alienado, pois o liberalismo através do principio da representatividade, idealizou o Estado como um órgão imparcial, capaz de representar toda a sociedade e dirigi-la através do poder delegado pelos indivíduos aos políticos, que segundo ele representam somente os interesses das classes dominantes.
A filosofia passou a criar representações do homem e da sociedade. A divisão social do trabalho tornou a filosofia atividade de um determinado grupo, sendo portanto parcial, e refletindo o pensamento desse grupo.
O homem só pode recuperar sua condição humana através da crítica radical ao sistema econômico, à política e à filosofia, que segundo Marx, excluiu o homem da participação efetiva na vida social. Essa crítica radial, na prática, se efetiva através da ação política consciente e transformadora. Marx propôs não apenas um novo método de pensar, mas também, um projeto de ação.
Classes Sociais
As ideias liberais surgidas com o iluminismo consideravam os homens, por natureza, iguais política e juridicamente. Liberdade e Justiça eram direitos inalienáveis de todo o cidadão.
Marx proclama a inexistência da igualdade natural, observando que o liberalismo vê os homens como átomos, como se estivessem livres das evidentes desigualdades estabelecidas pela sociedade. Diz que as desigualdades sociais são provocadas pelas relações de produção do sistema capitalista, as quais dividem os homens em proprietários e não proprietários dos meios de produção, onde as desigualdades são a base da formação das classes sociais.
Ocorre uma relação de exploração entre a classe dos proprietários, a burguesia, e a dos trabalhadores, o proletariado, em razão de que a posse dos meios de produção, sob a forma legal de propriedade dos meios de produção, faz com que o trabalhador para sobreviver venda a sua força de trabalho ao empresário capitalista, o qual se apropria do produto do trabalho de seus operários.
Diz ainda Marx que a relação entre o capitalista e o trabalhador é de oposição e antagonismo, face aos interesses inconciliáveis. O capitalista procura preservar seu direito à propriedade dos meios de produção, dos produtos e ainda explora o trabalho do operário, reduzindo-lhe o salário ou almpliando-lhe a jornada, o trabalhador por sua vez, procura diminuir a exploração ao lutar por uma menor jornada de trabalho, melhores salários e participação nos lucros.
Por outro lado, as relações entre as classes são complementares, pois uma não existe sem a outra. Só existem proprietários porque há uma massa de despossuídos que para sobreviver só dispõem de sua força de trabalho, a qual vendem para obter os bens que lhes assegurem a sobrevivência.
O Valor do Trabalho e o Lucro
Karl Marx considerava que o capitalismo entendia a força de trabalho como mera mercadoria que os trabalhadores colocavam à venda. Mas demonstrava que enquanto os outros produtos que poderiam ser adquiridos pelos capitalistas, ao serem usados se desgastavam ou desapareciam, ao passo que o uso da força de trabalho gerava a criação de valor. Essa, porém, não era uma ideia nova sobre a força de trabalho, pois Adam Smith, já teria proclamado o trabalho como a verdadeira fonte de riqueza das sociedades.
A Mais-Valia
Dentre as ideias demonstradas por Karl Marx, a que efetivamente trouxe uma visão ampla da forma como o capitalista obtém seu lucro, é a ideia da mais-valia.
Demonstra Marx exaustivamente como pode o capitalista, ao adquirir o trabalho do operário, para utilizá-lo na produção de bens, receber uma lucratividade, sem sequer oferecer o produto por preço maior que o próprio custo.
Exemplifica, dizendo que se em "x" horas de trabalho o operário produz um determinado bem, que custa para capitalista, um valor "z", se o capitalista conseguir aumentar a carga horária, o operário produzirá maior quantidade de bens, pelo mesmo salário, o que diminuirá o custo de produção, concedendo ao capitalista o valor "y" de ganho adicional. Isto é a mais-valia.
Pode ainda o capitalista obter mais-valia, ao acrescentar em seus meios de produção, uma máquina ou equipamento, que lhe aumente a produtividade, o que fará fatalmente que o custo de produção seja muito menor, e o valor trabalho sendo o mesmo, proporcionalmente estará valendo menos, e a obtenção do lucro será ainda maior para o capitalista.
A Contribuição do Pensamento de Marx
Sem dúvida o pensamento de Marx, veio a mudar o mundo em muitos aspectos, não tendo sequer um segmento social, que não tenha sofrido sua influência. Foi sem dúvida uma revolução social, a expansão de suas ideias, que de muitas formas contribuíram para o desenvolvimento das relações sociais, em alguns momentos modificando por completo a vida e a história de muitas nações.
Por outro lado, povos que adotaram seu sistema social, tiveram, por momentos, a sensação de estarem libertos, mas caíram na rotina de um sistema que os escravizou mais que a própria luta de classes, sem dar-lhes a oportunidade de crescimento pessoal e desenvolvimento social, posto que o estado dava-lhes o sustento e o trabalho, mostrando-se um feitor de maior peso que a própria luta pela sobrevivência nos sistemas capitalistas, o que fez com que a derrocada do socialismo se estabelecesse nos países do leste europeu.
Apesar da lógica exposta na afirmação de Marx, entendo que a única razão para o capitalista investir em meios de produção, e aquisição de mão de obra, correndo o risco da atividade empresarial, é a possibilidade de lucro, e consequentemente de obtenção de um crescimento patrimonial. O que significa, que não havendo vantagem e lucratividade, o capitalista, por certo, não arriscaria seu patrimônio, contratando empregados. As condições atuais de desemprego, e falta de investimentos em produção, seriam quiçá, resultado das pressões das organizações de trabalhadores que através de suas "conquistas" geraram desvantagens para o capitalista investir em produção, posto que ele paga salários nem sempre altos, mas com encargos que oneram de forma contundente seu custo de produção, além dos abusivos tributos a que se vê obrigado.
Vejo sem sombra de dúvida, atualidade, e realidade, no ainda que antigo, dizer de Rui Barbosa (Capital e Trabalho, in Campanhas Presidenciais 1919), que destaca ser a posição do Capital não antagônica ao Trabalho, sendo assim ambas, forças interdependentes.
"Não acrediteis que todos os males do sistema econômico predominante no mundo venham de que os meios de produção estejam com os detentores de capitais. Os operários não melhorariam, se, em vez de obedecer aos capitalistas, obedecessem aos funcionários do Estado socializado.
Assim como do trabalho depende o capital, assim, e na mesma proporção, do capital depende o trabalho. São as metades que, reciprocamente, se inteiram, de um organismo, cujos dois elementos viventes não se podem separar sem se destruírem."
CONCLUSÃO
Devemos sem sombra de dúvida, muito do que temos em termos de organização social, aos mestres da sociologia, cada qual dando-nos o melhor de seu intelecto, na busca de uma melhoria e de um desenvolvimento maior para a humanidade, que desde os tempos mais remotos, busca sua redenção.
Não se pode em momento algum, dizer que a humanidade estaria melhor ou pior se as posições dos pensadores sociais fossem diferentes do que aqui se analisou.
Todavia, temos muito ainda a modificar em nossa sociedade, cada um em sua atividade, pode ser um gerador de soluções voltadas ao crescimento socioeconômico, dentro de princípios éticos que construam uma sociedade mais justa e equânime.
domingo, 11 de julho de 2010
PENSANDO ÉTICA EM NOSSOS DIAS
(Antonio Augusto Waltrick Loureiro)
1. UMA VISÃO DA ÉTICA HOJE
Será que existe uma solução?
Existirá uma forma efetiva de evitar tais acontecimentos?
O que podemos constatar, a cada momento é a absoluta ausência de princípios norteadores que apontem para o bem, para a paz, para o cuidado, para a alteridade, para o respeito, para a probidade e acima de tudo para o caminho construtivo.
Os conceitos de certo e errado, que a nós foi apresentado pela família, pela escola, pelos ensinamentos religiosos, parecem que desapareceram, que se tornaram obsoletos ou inaplicáveis aos tempos atuais.
Tais fatos conduzem a uma reflexão profunda, a uma busca efetiva de meios de recuperação dos valores esquecidos e de uma paz construída em alicerces fortes e duradouros.
2. ENXERGAR OS FATOS DE FORMA CLARA
Todos já sabemos a resposta.
Assim, a dignidade mantém-se à distância deste “cidadão” brasileiro, que por não ter onde fazer sua higiene, sem roupas pelo menos limpas, sem um cabeleireiro e com a barba por fazer, perde mais uma vez a possibilidade de obter o trabalho e recuperar a dignidade que nunca deveria ter perdido.
Diante de tal quadro, como se pode esperar que o “cidadão” não vá descambar para a criminalidade, buscando sobreviver na sociedade. E assim ele obtém quiçá numa penitenciária o alimento de que necessita, a cama para dormir, mas certamente ficará ainda mais longe da dignidade, o que o torna mais distante da condição humana.
Se olharmos para o trabalho em nossa sociedade, vamos constatar que ele existe para alguns. Os que possuem qualificação precisam obtê-la em maior grau a cada dia. Os menos qualificados, são substituídos em muitas tarefas por máquinas que custam menos, não adoecem, não geram encargos sociais e produzem por logo tempo, sem reclamações, sem sindicatos ou mobilizações.
Além desse fato, temos que pensar no capital especulativo, que a cada dia e em especial em momentos de crise financeira, gera imensa acumulação nas mãos dos investidores, dos banqueiros e do fisco, sem ocupar a mão-de-obra ociosa e sem produzir alimentos, utilidades, serviços ou qualquer outro benefício social, ao abrigo da lei e sob a proteção do Estado.
Ao mesmo tempo, na atividade primária, o pequeno produtor rural, luta para pagar o financiamento dos insumos, para obter preços mínimos mais próximos do justo, contando sempre com a possibilidade de ter a safra frustrada pelas condições de inadequação climática.
Enquanto falamos de pessoas e de trabalho, o mau uso dos recursos naturais faz com que a cada minuto percam-se milhares de árvores nativas em áreas onde elas são de fundamental importância para a própria sobrevivência do planeta. As águas dos rios que abastecem as grandes cidades são maculadas por toneladas de dejetos humanos, de produtos químicos e pelo acúmulo de lixo lançado sem qualquer critério. Depois todos bebem dessa água mal tratada. O ar, do qual todos dependemos para respirar, recebe milhões de metros cúbicos de gases tóxicos, de metano proveniente da decomposição do lixo e da criação de gado e de CO2 da queima de combustíveis fósseis por milhões de motores ao redor do mundo.
Assim sofrem os humanos, os microorganismos, os animais, as plantas, mas ninguém está efetivamente preocupado, interessa produzir, obter o lucro industrial, descartar o lixo pelo menor custo e para os governos, arrecadar impostos. Podemos ver que está faltando muito para que possamos reverter a situação.
3. PARA CONSTRUIR UM MUNDO MELHOR
Temos que projetar um mundo onde a dignidade humana seja preservada, no qual os seres humanos tenham acesso à vida abundante por meio do trabalho, por meio da produção de bens que a todos favoreça. Onde cada pessoa que venha a nascer, tenha garantida a possibilidade de sobrevivência digna, que possa obter a cultura necessária, os saberes e a qualificação para viver uma vida produtiva. Temos que resgatar a razão dos empresários e dos governos, no sentido da oportunização de postos de trabalho, mesmo aos que não tenham a "aparência" esperada.
A sociedade tem que novamente humanizar-se, e temos que buscar o caminho para que isso ocorra. A solidariedade tem que estar presente em todos os momentos da vida, na família, na escola, nas ruas, nas empresas, na sociedade. Não podemos esperar um mundo melhor com pessoas vivendo nas ruas, sem posses, sem referenciais, sem qualidade.
O cuidado tem que estar presente, cuidado pelo outro, cuidado pela natureza, cuidado pela vida, o que gera o cuidado por si próprio, o cuidado pelo bem de todos.
Temos que proporcionar a todos um repensar as condições do mundo, construindo princípios em âmbito global, pois na visão de MacIntyre (2001), “A declaração de qualquer princípio universal é, no fim das contas, uma expressão das preferências da vontade do indivíduo e, para essa vontade, seus princípios têm e só podem ter a autoridade que ele escolheu lhes conferir ao adotá-los”, daí a importância de uma efetiva ação educativa. Cabe-nos, portanto, educar aos jovens e inserir os demais, nessa construção para que se processe a mudança.
Precisamos acima de tudo reavivar os princípios éticos, construir uma nova trilha a ser seguida por todos os que queiram viver em um mundo melhor, em uma sociedade mais justa, em uma cidade mais segura, com mais dignidade, confiança, segurança e consciência.
4. REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO
LIVROS:
MACINTIRE, Alasdair. DEPOIS DA VIRTUDE. Bauru, São Paulo: EDUSC, 2001.
BOFF, Leonardo. ETHOS mundial: um consenso mínimo entre os humanos. Brasília: LETRAVIVA, 2000.
TEXTOS:
GUARÍGLIA, Osvaldo – Ética e Política. Ed. UFRGS-Goethe-Instituto/ICBA, 1993
BOFF, Leonardo – Reflexão A Ética e a Formação de Valores na Sociedade. Instituto ETHOS, 2003
segunda-feira, 10 de agosto de 2009
A TEORIA DA JUSTIÇA DE JOHN RAWLS
Fonte: Educaterra – História, Cultura e Pensamento Voltaire Schilling
Johnson imita Lincoln
Para assinar o Voting Right Act de 1965, a lei que dava direitos iguais aos afro-americanos de votarem, o presidente Lyndon Johnson (1963-69) fez questão de cumprir a cerimônia na mesma sala da Casa Branca em que, um século antes dele, o presidente Lincoln, emancipara os negros que haviam servido no exército confederado. Com o fim dos constrangimentos legais que impediam dos negros serem cidadãos nos estados do Sul, completava-se assim uma etapa importante da Civil Rights Bill, aprovada pelo Congresso norte-americano um ano antes, em 1964. O objetivo da lei era claro, promover a integração racial e por um fim às práticas cotidianas discriminatórias que, especialmente no antigo cinturão confederado, estimulavam a segregação racial (motivo central da campanha pelos Direitos Civis do reverendo Martin Luther King). Com isso, esperava-se também por um término aos motins urbanos da população negra do Harlem, do Bedford-Stuyvesant em Nova Iorque, e os tumultos de Watts, em Los Angeles, de 1964-5, que deram prejuízos imensos aos negócios locais.
A nova lei do voto, ao remover as proibições para os negros exercerem seus direitos de cidadãos, procurou isolar os segregacionistas do Sul, tal como o governador George Wallace do Alabama, e igualmente esvaziar o movimento Black-power, liderado por Stokely Carmichael, um jovem intelectual negro radicalizado que anteriormente fora um dos líderes do SNCC (Student Nonviolent Coordinanting Committee). A política de promover a integração racial, por sua vez, fazia parte de um dos programas da chamada Great Society, a Grande Sociedade, o espetacular projeto dos democratas que visava extirpar a pobreza nos Estados Unidos. Atendendo a que, como disse o presidente Johnson, a América se transformasse " Num lugar onde os homens estarão mais atentos com a sua qualidade de vida do que com a quantidade de bens". Ele, o projeto, assentava-se no tripé de promover a mais ampla liberdade para todos, combater a escandalosa pobreza e, por fim, terminar com a injustiça racial.
Certa vez, Hegel escreveu que a Filosofia - tal como a coruja que só alça o vôo depois do entardecer - somente elabora uma teoria após as coisas terem ocorrido. Foi bem esse o caso da contribuição de John Rawls, surgida em livro em 1971, A Theory of Justice, a Teoria da Justiça, resultante direto do sucesso da campanha pelos Direitos Civis. Herdeiro da melhor tradição liberal, que principia com Locke, passando por Rousseau, Kant e Stuart Mills, Rawls debruçou-se sobre um dos mais espinhosos dilemas da sociedade democrática: como conciliar direitos iguais numa sociedade desigual, como harmonizar as ambições materiais dos mais talentosos e destros com os anseios dos menos favorecidos em melhorar sua vida e sua posição na sociedade? Tratou-se de um alentado esforço intelectual para conciliar a Meritocracia com a idéia da Igualdade.
A resposta que Rawls encontrou para resolver essas antinomias e posições conflitantes fizeram história. Nem a social-democracia européia, velha de mais de século e meio, adotando sempre uma política social pragmática, havia encontrado uma solução teórica-jurídica para tal desafio. Habermas, o maior filosofo alemão do pós-guerra, considerou-o, o livro de Rawls, um marco na história do pensamento, um turning point na teoria social moderna, abrindo caminho para a aceitação dos direitos das minorias e para a política da Affirmative Action, a ação positiva. Política de compensação social adotada em muitos estados dos Estados Unidos desde então, que visa ampliar e facilitar as possibilidades de ascensão aos empregos públicos e aos assentos universitários por parte daquelas minorias étnicas que deles tinham sido até então rejeitadas ou excluídas. Cumpre-se dessa forma a sua meta demaximize the welfare of society's worse-off member, de fazer com que a sociedade do bem-estar fosse maximizada em função dos que estão na pior situação, garantindo que a extensão dos direitos de cada um fosse o mais amplamente estendido, desde que compatível com a liberdade do outro. Se foi o projeto da Grande Sociedade quem impulsionou a teoria de Rawls, suas proposições, difundindo-se universalmente, terminaram por lançar as bases dos fundamentos ético-jurídicos do moderno Estado de bem-estar Social, vinte ou trinta anos depois ele ter sido implementado.
Para que isso seja realizável numa moderna democracia de modelo representativo é pertinente concordar inclusive que os representantes dos menos favorecidos (partidos populares, lideranças sindicais, minorias étnicas, certos grupos religiosos, e demais excluídos, etc..), sejam contemplados no jogo político com a ampliação da sua deputação, mesmo que em detrimento momentâneo da representação da maioria. Rawls aqui introduz o principio ético do altruísmo a ser exigido ou cobrado dos mais talentosos e aquinhoados - a abdicação consciente de certos privilégios e vantagens materiais legítimas em favor dos socialmente menos favorecidos.
Há nisso uma clara evocação, de origem calvinista, à limitação dos "direitos do talento", sem a qual ele considera difícil senão impossível por em pratica a equidade. Especialmente quando ele lembra que uma sociedade materialmente rica não significa necessariamente que ela é justa. Organizações sociais modestas, lembrou ele, podem apresentar um padrão de justiça bem maior do que encontra-se nas opulentas. Exemplo igual dessa "secularização do calvinismo" visando o apelo à concórdia social é a abundância no texto de Rawls de expressões como, além do citado altruísmo, "benevolência", "imparcialidade", "desinteresse mútuo", "desejos benevolentes", "situação eqüitativa", "bondade", "objeção de consciência", etc.
Worst off - Os socialmente desfavorecidos - Devem ter suas esperanças de ascensão e boa colocação social maximizadas, objetivo atingido por meio de legislação especial corretiva, reparadora das injustiças passadas.
Better off - Os mais favorecidos - Devem ter suas expectativas materiais minimizadas, sendo convencidos através do apelo altruístico de que o talento está a serviço do coletivo, preferencialmente voltado ao atendimento dos menos favorecidos.
Se a pregação de Rawls a favor da limitação dos benefícios obtidos pelos mais talentosos desgosta a maioria dos teóricos conservadores (é injusto retirar do talentoso as vantagens legítimas adquiridas por ele), a questão da equidade sobrepor-se como um sucedâneo a igualdade, fere os princípios dos teóricos democráticos mais radicais. Aparentemente ele descarta a possibilidade de haver uma distribuição dos bens igual para todos. Rawls aposta mais na eficácia equidade para aparar os feitos negativos da desigualdade.
Por mais que a sociedade liberal tenha proclamado ao longo dos tempos seu em empenho em favor da igualdade de oportunidades para todos, e na difusão universal dos direitos de cidadania, sabe-se que, na prática isso não ocorre. Um simples vislumbre da paisagem social existente na maioria dos países democráticos confirma que as afirmações pró-igualdade, alardeadas por todos, prendem-se mais à retórica do que à realidade. Evidentemente que pode-se superar isso, e a história assim o demonstrou, pela aplicação revolucionária de uma igualdade imposta pela violência ou pelo terror político, na qual todos terão acesso as mesmas coisas. Isso, porém, além de ter-se verificado inviável ou impraticável numa sociedade democrática, comete uma outra injustiça, visto que desconsidera as vantagens legitimas obtidas pelos talentosos e os bem sucedidos em geral.
A sociedade justa para Platão era aquela que alocava cada um dos seus integrantes segundo suas aptidões verificadas (inteligência, coragem ou apetite), cabendo o seu governo aos mais qualificados: os filósofos. Por conseguinte, sua visão favorecia um regime dominado, digamos, dos mais técnicos, dos mais talentosos e inteligentes (comumente aceita-se de que Platão teria sido o pai da tecnocracia moderna). Rawls inverte tal propósito. Como vimos, uma sociedade realmente justa para ele, sem que se descurasse da importância dos talentosos, é aquela que funciona em favor dos destituídos.
Conclusão essa que se choca frontalmente com a muito difundida concepção darwinista dos norte-americanos que divide a sociedade entre vencedores (winners) e perdedores (losers). Como poderiam eles aceitar - numa cultura que celebra o vencedor mais do que qualquer outra que se conheça - uma doutrina voltada preferencialmente a favor dos desvalidos, dos que não tiveram condições de seguir na competição, ou foram alijados dela, mesmo que o objetivo seja nobre visando corrigir um erro do passado? Seja como for, a Teoria da Justiça serve hoje como inspiração para a maior parte dos reformadores sociais em atividade.
domingo, 21 de junho de 2009
Vários estudos têm alertado que tanto a população da Terra quanto seus níveis de consumo crescem mais rapidamente do que a capacidade de regeneração dos sistemas naturais. Um dos mais recentes, o relatório Planeta Vivo, elaborado pela ONG internacional WWF, estima que atualmente três quartos da população mundial vivem em países que consomem mais recursos do que conseguem repor. A reportagem é de Andrea Vialli publicada pelo portal do jornal O Estado de S. Paulo, 15-05-2009.
Só Estados Unidos e China consomem, cada um, 21% dos recursos naturais do planeta. Até 1960, a maior parte dos países vivia dentro de seus limites ecológicos. Em poucas décadas do atual modelo de produção e consumo, a humanidade exauriu 60% da água disponível e dizimou um terço das espécies vivas do planeta. Segundo o estudo do WWF, o colapso ambiental pode custar ao mundo US$ 4,5 trilhões por ano em reparações. E, apesar das promessas de que o crescimento do PIB reduziria a pobreza, as desigualdades econômicas se mantêm: a cada US$ 160 produzidos no mundo, só US$ 0,60 chegam efetivamente aos mais pobres. “O argumento de que o crescimento econômico é a solução já não basta. Não há recursos naturais para suportar o crescimento constante. A Terra é finita e a economia clássica sempre ignorou essa verdade elementar”, afirma o ecoeconomista Hugo Penteado, autor do livro Ecoeconomia – Uma Nova Abordagem. Penteado não está sozinho. A urgência dos problemas ambientais e suas implicações para a economia das nações têm sido terreno fértil para o desenvolvimento da ecoeconomia, ou economia ecológica. Assim como as críticas ao PIB, a ecoeconomia não é exatamente nova. Seus principais expoentes começaram a surgir na década de 1960. Hoje, estão paulatinamente ganhando projeção graças à visibilidade que o tema sustentabilidade conquistou. Para essa escola, as novas métricas para medir o crescimento da economia não bastam, embora sejam bem-vindas em um processo de transição. Para a ecoeconomia, é preciso parar de crescer em níveis exponenciais e reproduzir – ou “biomimetizar” – os ciclos da natureza: para ser sustentável, a economia deve caminhar para ser cada vez mais parecida com os processos naturais. “A economia baseada no mecanicismo não oferece mais respostas. É preciso encontrar um novo modelo, que dê respostas a questões como geração de empregos, desenvolvimento com qualidade e até mesmo uma desmaterialização do sistema. Vender serviços, não apenas produtos, e também produzir em ciclos fechados, sem desperdício”, afirma Paulo Durval Branco, professor da Escola Superior de Conservação Ambiental e Sustentabilidade (Escas). Segundo Branco, embora as empresas venham repetindo a palavra sustentabilidade como um mantra, são pouquíssimas as que fizeram mudanças efetivas em seus modelos de negócio. O desperdício de matérias-primas, o estímulo ao consumismo e a obsolescência programada (bens fabricados com data certa para serem substituídos ) ainda ditam as regras. “Mesmo nas companhias que são consideradas vanguarda em sustentabilidade, essas questões não estão sendo observadas. O paradigma vigente é crescer, conquistar mais consumidores, elevar o lucro do acionista.” Estacionária Outro pilar da ecoeconomia é a defesa do estado estacionário – conceito reformulado pelo economista Herman Daly, da Universidade de Maryland, nos Estados Unidos, com base nas ideias de John Stuart Mill, um dos pais da economia política do século 19. Daly, que foi economista sênior do departamento de Meio Ambiente do Banco Mundial, defende que “a economia sustentável deve, em algum ponto, parar de crescer. Embora isso não signifique, necessariamente, parar de se desenvolver.” A transição rumo à economia sustentável proposta por Daly implica eliminar o fator quantidade. A produção de bens seria limitada à necessidade de reposição dos itens. Produtos de vida mais longa poderiam ser substituídos mais lentamente, com menor impacto sobre os recursos naturais. Nesse cenário, o fabricante prestaria serviços vinculados a bens alugados, como manutenção, recolhimento e reciclagem ao fim de sua vida útil. No setor financeiro, a ausência de crescimento provavelmente faria que os juros caíssem. E também traria mudanças no alvo do sistema tributário. “Me parece razoável taxar o que queremos evitar, o esgotamento de recursos e a poluição, e deixar de taxar o que mais queremos, a renda.”
Moral e Política
Sob o título acima, Hans Küng, teólogo e presidente da Fundação Ética Global, publicou no jornal La Stampa, 5-5-2008, o seguinte artigo.
Uma pergunta ética crucial para o sucessor de Bush é: um Presidente deve mentir? Há circunstâncias nas quais é constrangido a fazê-lo? O ex-secretário de Estado Kissinger não tem dificuldade em justificar as mentiras. Sustenta que o Estado, e por isso o estadista tenha uma moral diversa daquela do cidadão. Pôs em prática esta teoria nos seus anos da administração Nixon e mais tarde a defendeu energicamente no seu ensaio “Diplomacy” (1994, “A arte da diplomacia”), citando figuras históricas que ele admira, como Richelieu, Metternich, Bismarck e Roosevelt.
Quando eu lhe disse que aquele gênero de política do poder me parecia inaceitável, ele me respondeu, não sem ironia, que os teólogos vêem as coisas “do alto”, enquanto os homens de Estado as observam “de baixo”.
Fiz a mesma pergunta sobre a mentira e a ética política a um amigo comum, o ex-chanceler da Alemanha federal Helmut Schmidt, por ocasião da Conferência de Ética Global que ele apresentou na Universidade de Tübingen: “Henry Kissinger diz que o Estado tem uma moral diversa daquela de um individuo – a velha tradição dos tempos de Maquiavel. Um político que se ocupe de assuntos externos tem realmente direito a uma conduta especial?”
Schmidt replicou: “Estou firmemente convencido que não existe uma moral diversa para o homem político, também para aquele que se ocupa de negócios exteriores. A idéia oposta foi defendida por muitos políticos na Europa do século XIX. Talvez Henry Kissinger ainda esteja vivendo no século dezenove… Não sei. Nem sei se ele hoje ainda defenderia aquele ponto de vista”.
Aparentemente sim. Em sua recente recomendação de um maior envolvimento militar na guerra no Iraque e no Afeganistão, Kissinger demonstrou ser um político de poder que pensa em termos maquiavélicos. Porém recentemente se empenhou a favor do desarmamento nuclear total – uma contradição ou um sinal de sabedoria advindo com a idade?
Questões de ética também são discutidas nos encontros do InterAction Council, o clube dos ex-chefes de Estado e de governo, do qual sou conselheiro acadêmico. Recordo-me que em 1997 nenhuma questão concernente à Declaração Universal das responsabilidades do homem analisada pelo Conselho foi tão intensamente discutida quanto a pergunta “Mentir?”. O artigo 12 daquela declaração se refere à sinceridade e recita: “Ninguém, embora seja alto o poder, deveria mentir”.
Segue, porém, imediatamente um contrapeso: “O direito à privacidade e à discrição pessoal e profissional seja respeitado. Ninguém é obrigado a dizer a verdade sempre e a todos”.
Por conseguinte, embora com todo o amor pela verdade, esta não é aplicada com fanatismo. Não exageremos. Os políticos são seres humanos e também uma pessoa sincera pode mentir, quando se encontra em dificuldade. Não estou falando de mentiras contadas por gracejo, mas de mentiras intencionais. Uma mentira é uma declaração que contrasta com as idéias de quem a diz e visa enganar os outros por alguma vantagem pessoal ou dano de outro.
Nos Dez Mandamentos citados em Êxodo 20:16 se lê: “Não dar falso testemunho nas relações com os outros”.
O ex-ministro das Relações Exteriores de um país do Sudeste asiático me disse certa vez sorrindo que uma de suas antigas definições de embaixador era: “Um homem mandado ao exterior pode mentir”. Hoje, no entanto, uma diplomacia eficaz já não pode mais ser construída sobre aquela teoria. Na época de Metternich e Talleyrand dois diplomatas ainda podiam mentir um ao outro. Hoje, ao invés, uma diplomacia secreta eficaz requer franqueza, não obstante as mais atuais táticas de negociação. Os truques sujos e os enganos de longo prazo não compensam. Por quê? Porque minam a confiança. E, sem confiança é impossível uma política que dê forma ao futuro.
Assim, a primeira virtude diplomática é o amor pela verdade, segundo o que escreveu o diplomata britânico Sir Harold Nicolson em seu clássico de 1933 “Diplomacy” – que, incidentalmente, Kissinger cita somente de má vontade na página do copyright de seu “Diplomacy” (e depois ignora).
Isto significa que estadistas como Thomas Jefferson tinham razão: existe uma única ética. Os políticos e os homens de Estado não têm direito a uma moral especial. Os critérios éticos que se aplicam aos indivíduos se aplicam também aos Estados. Nem mesmo os fins políticos justificam os meios imorais.
Assim, a verdade, que foi reconhecida pelo Iluminismo como a pré-condição da sociedade humana, vale não só para os cidadãos comuns, mas também para os políticos – e, mesmo, sobretudo para os políticos. Por quê?
Porque os políticos têm uma responsabilidade partIcular pelo bem comum e, ainda mais, gozam de um número considerável de privilégios. É compreensível que, se mentem publicamente e rompem a palavra dada (sobretudo após as eleições), isto seja usado contra eles e que nas democracias eles paguem um preço: com a desconfiança e a perda da credibilidade, dos votos nas eleições, de seu próprio cargo.
As mentiras pessoais, como aquelas do ex-presidente dos EUA Bill Clinton no escândalo Lewinsky, são péssimas. Mas, o que é pior é a falsidade que entra no coração dos indivíduos e de suas atitudes de base (pode-se ver isso com o presidente Bush nos últimos cinco anos da guerra no Iraque).